Sobram muitas histórias por entrelaçar. Nesta altura do ano — em que os meses parecem suceder-se cada vez mais “apertados” em direção ao final do ano — tenho tendência a acumular: histórias e ideias; objetos e cansaço. Este ano prometi a mim mesma que iria ser gentil e respeitar o descanso que o inverno exige: repouso, sono e paz interior em dobro. Tendo em conta o estado do mundo por estes dias, estas afirmações poderão parecer um tanto frívolas — estamos carecas de ouvir falar no poder do auto-cuidado, mas raramente associado a uma ideia de ativismo. No entanto, sabemos que pessoas doentes e exaustas não mudam o mundo, pelo que zelar pelo nosso bem-estar (e dos que nos são próximos) é o mínimo que temos de assegurar para podermos sequer pensar na mudança que queremos ver no mundo, quanto mais em sair de casa para fazer a diferença.
E é sobre as ações que fazem a diferença que tenho refletido mais ultimamente. Quais são as acções que importam realmente? Será que é participar em manifestações e vigílias? Será que é vestir apenas roupa feita em casa ou herdada? Será que é boicotar certas marcas e grandes superfícies? Será que é fazer parte de um partido, de uma associação, de um movimento cívico? Será que é partilhar stories no Instagram sobre política internacional ou ativismo climático?
E será que interessa o que é que faz a diferença, desde que tenha realmente algum impacto no mundo (e no nosso mundo interior?). Quero muito voltar a este tópico e escrever mais extensamente sobre ele, mas por agora quero deixá-lo em aberto, sujeito às vossas ideias. O que vos sugere instintivamente responder a estas perguntas? Como é que sentem que fazem a diferença, no vosso dia-a-dia? Respondam a este email com as vossas inquietações e prometo que as incluirei no próximo texto.
Quero muito falar sobre coisas que ainda não sei encaixar neste no espaço exíguo de uma newsletter. Faz-me falta a conversa, o debate sobre as ideias que temos sobre as coisas sem ser só um concurso de egos, mas antes uma contribuição generosa de cada pessoa para o bem comum. Esses lugares são cada vez mais raros. E porque procuro ativamente esses lugares, que podem tanto ser encontros presenciais ou filmes ou livros, quero partilhar convosco alguns dos que me parecem urgentes conhecerem e que eu tenho gostado tanto de conhecer. Uma espécie de mini-listas de melhores do ano, com uma seleção mais emocial que racional. Aqui vai:
Algumas leituras essenciais
Livros que ainda não li, mas já li muito sobre eles (no topo da minha wishlist)
Doppelganger de Naomi Klein (aqui: dois capítulos de download livre)
The Emotional Life of Populism de Eva Illouz
Um dia na vida de Abed Salama de Nathan Thrall
Os livros na minha mesa de cabeceira: a pilha de livros começados e não terminados
The Mother of All Questions, Rebecca Solnit
Conversations with friends, Sally Rooney
As Ondas, Virginia Wolf
Livros urgentes: dos que já li e reli alguns parágrafos, e são material para a escrita que vou fazendo
Afrotopia Felwine Sarr
Diálogos sobre Arte e Política Ken Loach e Édouard Louis
Líbano, Labirinto Alexandra Lucas Coelho
Os livros que li este ano por puro prazer
Beautiful world where are you, Sally Rooney
Ten steps to Nannete, Hannah Gadsby
Mar Negro e Desvio, da dupla imbatível Ana Pessoa e Bernardo P. Carvalho
Revistas que comprei este ano (contam-se pelos dedos das mãos)
Laine Magazine issue 16, para tricotar este casaco da autoria da Rosa Pomar
Monocle Magazine de Julho/Agosto, para ler o artigo sobre a Mariamélia
Electra edição 21, para ler o artigo de André Barata “Do lazer ocioclasta”, e o maravilhoso artigo de Carolina Flores “Críticas anti-woke são uma armadilha antidemocrática” (mas aconselho ler toda!)
Um pouco de tudo
1 clube de leitura — virtual (e ocasionalmente presencial)
Heroídes, clube de leitura feminista
1 BD futurista
'42 - Novela eco-futurista da autoria de João Camargo com ilustrações de Nuno Saraiva no Setenta e Quatro
1 série de investigação jornalística
Palestina: histórias de um país ocupado do Fumaça
1 canal de TV (nem tudo é mau)
Canal 180
1 rádio, à qual sou fiel
SBSR.FM
Finalmente os filmes
Não poderia faltar uma lista de filmes do ano. Aqui, podem acompanhar os filmes que vejo no cinema, o último dos quais, uma viagem à infância sem ser a minha, mas com referências da época em que nasci trazidas para a cidade onde vivo hoje — o doce Os amigos do Gaspar: uma reunião na cidade. Depois da estreia no Batalha, no próximo ano estará em exibição em mais salas pelo país.
2023 excedeu muito a quota de filmes portugueses óptimos que vi (e outros que queria ter visto). Espero que Mal Viver ganhe os tão afamados Óscares: João Canijo e “as suas” atrizes merecem-no.
Do conforto do vosso sofá, não percam a retrospetiva da filmografia de John Cassavettes, que depois de estar na programação deste ano do Cinema Batalha, está a passar na RTP2, às sextas-feiras à noite. O primeiro filme do realizador, Shadows, um objeto artístico da beat generation, é assombrante e vanguardista.
Deixo aqui os que mais me marcaram este ano, na sala de cinema:
1 documetário pessoal: Retratos Fantasmas (2023) de Kleber Mendonça Filho
3 filmes portugueses, todos protagonizados por mulheres: Mal viver (2023) de João Canijo / Légua (2023) de João Miller Guerra e Filipa Reis / Cidade Rabat (2023) Susana Nobre
1 filme dos anos 90, que é pura poesia, oral e visual: Daughters of the dust (1991) de Julie Dash
Como presente de Natal, enviem-me de volta os vossos cromos: as séries que viram, os filmes, os livros que leram, os podcasts que ouviram e tudo o que vos ajuda a acreditar num mundo um bocadinho melhor.
Boas festas, e que estas semanas sejam sobretudo de descanso e de paz, e também de alguns pecados ;-)